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21/08/2003 - Brasil : salários

Acordos sequer repõem perdas com a inflação

Segundo o Dieese, 54,4% das negociações tiveram reajuste inferior ao INPC

MARCELO REHDER

Joaquim Vicente Mariano é um dos 600 metalúrgicos da Zanettini Barossi, fabricante de autopeças instalada no bairro de Vila Carioca, na zona sul da cidade de São Paulo, que concordaram em abrir mão de parte de suas reivindicações para manter o emprego até o fim do ano. Mariano vai receber só um terço do prêmio de Participação nos Lucros ou Resultados (PLR) a que tinha direito este ano, o que representa R$ 200. Em troca, a empresa deixará de demitir 10% do quadro de funcionários (60 pessoas) como planejava.

O caso de Mariano não é isolado. O Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) divulgou ontem estudo mostrando que, pela primeira vez desde a extinção da política salarial (1994), a maioria dos acordos fechados em todo o País no primeiro semestre deste ano não conseguiu repor sequer as perdas com a inflação.

De um total de 149 negociações registradas pelo Dieese, nada menos do que 81 (54,4%) resultaram em reajustes salariais inferiores à variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O resultado foi pior que o do primeiro semestre de 1999, que era considerado o período mais desfavorável para as negociações salariais, em que 45% dos acordos haviam ficado abaixo da inflação.

"Esses resultados tão ruins refletem o quadro de retração da economia neste primeiro semestre", diz o supervisor da Secretaria de Atendimento Técnico do Dieese, José Silvestre Prado de Oliveira.

Dificuldades - Além dos juros altos, a inflação se manteve em níveis bastante elevados nos últimos seis meses, dificultando as negociações para recomposição dos salários. Pela primeira vez desde o início do Plano Real, em 1994, as discussões envolveram índices de reposição de perdas com a inflação entre 14% e 20%. E além da dificuldade para zerar a inflação, em 33% dos acordos os reajustes foram parcelados para aliviar o custo das empresas. Nos últimos seis anos, esse recurso não passou de 9% dos acordos analisados pelo Dieese.

"Hoje é muito mais interessante manter o posto de trabalho do que lutar por uma coisa que não vai resolver o problema de ninguém", diz o metalúrgico Mariano, referindo-se ao acordo aprovado pelos trabalhadores da Zanettini Barossi, que trocaram parte da PLR por estabilidade no emprego até 31 de dezembro.

Desde o início do ano, a empresa registrou queda de 10% nas vendas, de acordo com o seu presidente, Wagner Pofo. No mês passado e na primeira quinzena de agosto, a queda foi ainda maior, de 18%. (©O Estado de S.Paulo)