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22/08/2003 - Brasil : sem-terra

MST acusa Judiciário de "parcialidade"

SÍLVIA FREIRE
da Agência Folha
LÉO GERCHMANN
da Agência Folha, em Porto Alegre

O líder do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) paulista Gilmar Mauro afirmou ontem que o Poder Judiciário tem sido parcial na apreciação das questões envolvendo sem-terra no Estado.

"A Justiça está ajudando a agravar a violência no campo, e não ajudando a resolver os conflitos. Está sendo parcial", disse Mauro durante uma audiência pública na Assembléia Legislativa para discutir a violência no campo.

Segundo o líder do MST, existem mais de 20 áreas no Estado de São Paulo aguardando a imissão na posse da Justiça para serem desapropriadas. "Essa imissões na posse, em algumas áreas, estão demorando dois, três, quatro anos e ainda não foram concedidas", disse Mauro. "Muito diferente do caso do MST, em que se monta um inquérito rapidamente, decreta-se prisão e prende-se com muita rapidez e agilidade."

O MST, convencido de que o STF (Supremo Tribunal Federal) tem usado critérios políticos em suas decisões, pressionará o governo federal a agir institucionalmente para superar eventuais empecilhos à efetivação da reforma.

Questionado pela Agência Folha se a decisão do STF anulando desapropriação de 13,2 mil hectares em São Gabriel (RS) pode ter relação com a resistência do governo em estabelecer o teto salarial que os juízes pediam na reforma da Previdência, o líder do MST João Pedro Stedile respondeu: "Acho que foi a conjugação de vários fatores políticos ao mesmo tempo, entre eles, esse".

O advogado do MST Jurandir da Silva acredita que o STF "deu um recado muito forte para [o presidente Luiz Inácio] Lula [da Silva]" e que o governo "tem de ser pressionado".

Outros integrantes do MST ouvidos pela Agência Folha também defenderam uma atuação que pressione o Executivo a agir.

Uma das primeiras medidas a serem propostas pelo MST ao governo será a de conseguir a área em São Gabriel por meio da quitação de dívidas do proprietário da área, Alfredo Southall.

As dívidas de Southall (que ele reconhece, mas diz ainda as estar discutindo judicialmente) chegam a R$ 37 milhões --R$ 27 milhões desse valor se referem a débitos com o setor público. O MST proporá que o governo tente realizar um abate das dívidas --as terras valeriam R$ 26 milhões.

A ofensiva do MST teve início com o deputado estadual Frei Sérgio Görgen (PT-RS), que acusou a ministra do STF Ellen Gracie Northfleet de ser parente da mulher de Southall. O ex-marido de Ellen Gracie, que relatou a decisão a respeito de São Gabriel, é primo-irmão da mulher de Southall. Görgen tentará, via Ministério Público, anular a decisão do STF, alegando a "suspeição" da ministra. Ela nega o parentesco.

Outro lado

O presidente do STF, Maurício Corrêa, disse, por meio de sua assessoria, que não comentaria a declaração de Stedile. Anteontem, o STF julgou dois mandados de segurança contra decretos de desapropriação de terras invadidas.

Em um deles, o tribunal manteve o processo de desapropriação da fazenda Dois Irmãos, em Ipiaú (BA). A votação foi dividida, e Corrêa deu o voto de desempate. A maioria entendeu que a invasão de 4.000 metros quadrados não comprometeu o resultado da vistoria sobre produtividade do imóvel, que tem 890 mil m2.

No outro, os ministros anularam o processo de desapropriação da fazenda Niterói, em Novo Lino (AL), porque consideraram que o decreto foi irregular.

A Agência Folha tentou falar com o presidente do Tribunal de Justiça de SP, Sérgio Augusto Nigro Conceição, sobre as críticas de Mauro, mas não conseguiu localizá-lo até o final desta edição. (©Folha Online)