19/07/2006 -
Álcalis entra em crise e pára a produção
Vera Saavedra Durão e Ivo Ribeiro
Parada há 90 dias por falta de caixa, matéria-prima e problemas internos de gestão, a Cia. Nacional de Álcalis (CNA), única fábrica de barrilha do país, situada em Arraial do Cabo (RJ), depende de uma injeção imediata de recursos de R$ 7 milhões para voltar a operar, disse ao Valor o coordenador do grupo de gestão da Nova Álcalis, Aloísio Caiado. A companhia, de 63 anos de fundação, deve cerca de R$ 30 milhões a fornecedores e bancos privados e não paga salários aos seus quase mil empregados há mais de três meses.
Caiado, que tem quase 30 anos de empresa, reconhece que a situação é grave, mas informou que está elaborando um projeto de reestruturação de negócios para tirar a Nova Álcalis "do fundo do poço".
"Estamos trabalhando desesperadamente para retomar a operação em agosto", disse. Em 29 de maio, ele assumiu o cargo de coordenador do novo grupo de gestão (com quatro integrantes - dois ex-diretores e dois sindicalistas), no lugar de parte da antiga diretoria indicada pelo armador José Fragoso Pires, que comprou a empresa em 1992, num leilão de privatização, e a "doou" aos empregados em janeiro de 2004. Executivos indicados por Pires foram tirados por "dissidentes" com apoio do Sindicato dos Trabalhadores da Álcalis, insatisfeito com a situação de "deterioração" da companhia. Mas, o presidente estatutário, Antonio Carlos Feres, foi mantido no cargo.
A empresa corre o risco de fechar se não for socorrida, reconhecem seus novos administradores. Caiado e Alexandre Alves, presidente do Sindicato, atribuem a situação quase falimentar uma série de fatores, como: a falta de matéria-prima (devido à falta de pagamento a importadores de barrilha argentina) e a dívida de R$ 16 milhões com a CEG, fornecedora do principal insumo, o gás natural, que está em negociação.
A valorização do real, segundo Caiado, foi "a pá de cal", pois tornou a barrilha nacional bem mais cara que a importada. "O câmbio foi muito nocivo para nós. A barrilha que entrou no mercado nacional este ano, oriunda dos EUA, custa ao comprador US$ 226 (R$ 497 a tonelada, CIF, incluído imposto de importação de 10% e frete, e demais taxas. O produto nacional atinge R$ 600, sem impostos."
Segundo Caiado, que também é diretor comercial da CNA, mesmo sendo a única fornecedora nacional, isso a obriga a baixar o preço para conservar a clientela e sobreviver. Ele diz que é difícil competir com o grupo de empresas americanas reunidas na Ansac (American Natural Soda Ash Corporation), formado por FMC, Solvey Minerals e General Chemical e outras, que produzem 10,9 milhões de toneladas por ano, tem na América Latina seu principal mercado.
A estratégia dos novos gestores para recuperar a CNA por receber no mínimo R$ 3 milhões da prefeitura de Cabo Frio, pela indenização de terreno expropriado para construção do aeroporto de Cabo Frio. No dia 14 de julho, o juiz Valnio Franco Pacheco, do Fórum local, deu veredicto favorável ao pagamento de R$ 8,8 milhões à Nova Álcalis. "Mas, acredito que vão recorrer, pois nos ofereceram R$ 2, 7 milhões", disse Caiado.
Além disso, estudam com o apoio da Codin (Cia. de Desenvolvimento do Estado do Rio), a criação de uma área de negócios a alguns quilômetros da fábrica, onde têm um porto e um aeroporto. O presidente da Codin, Hélio Cabral, disse que o Estado está empenhado em apoiar a empresa. O terreno para essa área pode ser vendido a interessados em explorar comércio atacadista e de serviços portuários e aeroviários, com potenciais clientes da cidade de Macaé.
Além disso, os novos gestores estão solicitaram ao BNDES um empréstimo de R$ 60 milhões para investir na empresa. "Há dez anos não se faz um investimento de modernização na companhia", destaca Caiado. Ainda não houve entrada de consulta de crédito, informou uma fonte. Caiado disse que a CNA não tem dívidas com o BNDES e por isso pode dar em garantia ativos, como um terrenos entre Arraial do Cabo e Cabo Frio.
O que há é uma inadimplência da Cirne, empresa do grupo Fragoso Pires, que arrematou a CNA em 1992. O débito é estimado em R$ 200 milhões. A renovação dos quadros deixados pelo empresário só ocorreu agora, em maio.
Para Alexandre Alves, presidente do sindicato dos trabalhadores, a deterioração do parque fabril da CNA foi constante de 1992 a 2002, até sua paralisação. Para ele, a situação da empresa, com capacidade de produzir 250 mil toneladas por ano, é estratégica, pois "sem ela as multinacionais vão tomar conta desse imenso mercado".
O consumo de barrilha no país, usado principalmente nas indústrias de vidro e detergentes (95%) soma 650 mil toneladas ao ano. Cerca de 70% já era importado. Além da fábrica do Rio, a empresa tem o projeto Alcanorte, paralisado, no Rio Grande do Norte, que depende de mais US$ 100 milhões.
Fonte: Valor
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