23/07/2006 -
"Os sindicatos deveriam atuar mais e propor as ações civis"
Da Reportagem
Entrevista: Roberto Rangel Marcondes, procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho em São Paulo
Nilson Regalado
Um mês antes de desembarcar em Santos, o chefe da Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região, Roberto Rangel Marcondes, adianta que o órgão será parceiro dos trabalhadores no que diz respeito ao cumprimento da legislação trabalhista.
Entretanto, Marcondes admite uma certa decepção em relação à atuação dos sindicatos, que estariam deixando de lutar pelos interesses das categorias que representam para se envolver em política partidária.
Com inauguração prevista para 28 de agosto, o ofício do MPT em Santos deverá contar inicialmente com dois procuradores e mais nove servidores. Porém, as audiências devem começar só em setembro.
A Tribuna Por que a Procuradoria Regional do Trabalho resolveu instalar um ofício na Baixada Santista?
Marcondes O objetivo é a aproximação do Ministério Público do Trabalho junto ao jurisdicionado, junto à sociedade. A finalidade é ir para o interior em razão da grande demanda que temos. Historicamente, o MPT sempre esteve presente nas sedes dos Tribunais Regionais do Trabalho, que são 24 no País, normalmente nas capitais dos estados. Queremos estar próximo das varas do trabalho, dos sindicatos, dos municípios e dos trabalhadores que, às vezes, não têm condições de pagar o transporte até a Capital.
AT E qual vai ser a área de abrangência desse ofício de Santos?
Marcondes De Bertioga à Praia Grande. Decidimos que o ofício será em Santos porque a Cidade abriga o maior Porto do Brasil e acaba sendo central, próximo das rodovias. Isso facilita a locomoção dos procuradores do trabalho caso precisem atender alguma demanda de urgência nos outros municípios da região. Muitas vezes o trabalhador, o sindicato, fica inibido de vir até o Ministério Público apresentar o seu problema, a dificuldade que enfrenta, algum descumprimento da legislação trabalhista.
AT Qual é o volume de trabalho que a Baixada Santista dá para o Ministério Público do Trabalho?
Marcondes Hoje, a Baixada Santista responde por cerca de 10% da demanda da Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região. Essa é uma demanda reprimida. Com toda certeza ela vai aumentar assim que os procuradores estiverem em Santos porque eles vão estar mais perto dos trabalhadores, dos sindicatos.
AT Em números absolutos quanto representam esses 10%?
Marcondes Inquéritos civis em andamento são 330. Ações em primeira instância são 58, que têm o Ministério Público do Trabalho como órgão interveniente. Temos mais 25 ações civis públicas que estão em andamento.
AT Mas a região tem peculiaridades, principalmente na questão dos avulsos, que têm um regime de trabalho diferente dos celetistas, dos servidores públicos...
Marcondes Nosso grande objetivo também é conhecer melhor a realidade, a peculiaridade da Baixada Santista. Muitas vezes os procuradores que estão atuando em São Paulo não conhecem essa realidade da região e a importância que tem, tanto o Pólo Industrial de Cubatão quanto o Porto de Santos e o comércio da região.
AT Mas os procuradores que vão atuar na Baixada Santista terão de passar por algum treinamento para conhecer as peculiaridades do trabalho no Porto, por exemplo...
Marcondes Sem dúvida a atuação dos procuradores na região tem demonstrado a importância de conhecer as peculiaridades do trabalho no Porto, para saber as empresas onde encontramos os maiores problemas de meio ambiente relacionado ao trabalho. Temos uma coordenadoria nacional que atua nos portos. Esse grupo é formado por procuradores muito preparados e extremamente especializados na matéria e que já tem ido muitas vezes a Santos. A atuação desse grupo vai continuar, não é em razão da presença de novos procuradores que eles deixarão de dar suporte. Mas, com certeza, a participação diária desses novos procuradores vai permitir uma aproximação maior com o Ogmo, com os avulsos e conhecendo até melhor as diversas atividades que são desenvolvidas no Porto.
AT E quantos procuradores serão deslocados para Santos?
Marcondes Inicialmente, a previsão é de dois procuradores e, para 2007, a expectativa é que sejam quatro, dependendo do número de aprovados nos concursos públicos.
AT Então, todos os procuradores serão recém aprovados no concurso?
Marcondes Os procuradores que vão para Santos já têm experiência, com certeza não serão os recém aprovados. São procuradores que estão em outros estados e que sejam de São Paulo ou estejam dispostos a vir para cá. Temos treinamento constante e grupos de discussão e, por mais longe que o procurador esteja, quando o procurador tem algum problema ele encaminha sua dúvida e procuradores do Brasil inteiro acabam dando o apoio. Mesmo que os procuradores nunca tenham atuado em nenhuma questão portuária, eles terão o apoio de procuradores que conheçam melhor o problema.
AT E quantos servidores serão deslocados para Santos para dar suporte ao trabalho dos procuradores?
Marcondes Contamos atualmente com três servidores, um analista processual, uma técnica administrativa e um motorista que irão para Santos. Temos também o apoio dos prefeitos da Baixada Santista que já se comprometeram a ceder mais seis servidores concursados.
AT E o que é que a Baixada Santista vai ganhar com a chegada do Ministério Público do Trabalho?
Marcondes Será muito benéfico para toda a região. Entendo que a sociedade toda ganha porque o Ministério Público do Trabalho defende os interesses difusos e coletivos de toda a sociedade, em especial o respeito à legislação trabalhista, desde o combate ao trabalho infantil e degradante, discriminação nas relações de trabalho, moralidade administrativa. Os trabalhadores acabam tendo, sem dúvida, uma proteção, Muitas vezes, o Ministério Público do Trabalho também é chamado para mediar conflitos coletivos de trabalho.
AT E como vai ser a relação do MPT com a Subdelegacia do Trabalho? Eles vivem se queixando que não há auditores suficientes para fiscalizar eventuais irregularidades...
Marcondes Nossa relação com a Delegacia Regional do Trabalho sempre foi de cooperação. Com certeza, vamos ter de eleger os pontos principais, os que têm demanda de urgência e atuar em conjunto. Entre essas prioridades estão o combate à exploração da criança e a regularização do trabalho do adolescente e do imigrante estrangeiro, além do combate à prostituição infantil. O Ministério Público do Trabalho precisa desempenhar um papel mais pró-ativo, preventivo e de acompanhamento das políticas públicas.
AT E como vai ser a relação com os sindicatos?
Marcondes Temos de procurar os sindicatos da mesma forma que os sindicatos procuram o Ministério Público do Trabalho. Nossa ligação com os sindicatos dos trabalhadores é muito positiva. Muitas vezes são eles que trazem as demandas. Nosso relacionamento com o sindicato das empresas é muito bom. O sindicato tem a co-legitimidade, junto com o Ministério Público, para propor ações civis públicas. Muitas vezes os sindicatos de trabalhadores procuram o Ministério Público para que investigue e ajuíze eventual ação civil pública. Eles deveriam atuar mais e propor as ações civis públicas porque eles conhecem a realidade do setor muito melhor do que nós.
AT Isso representa uma crítica à atuação dos sindicatos?
Marcondes Eu gostaria, talvez seja idealismo, que os sindicatos como representantes dos trabalhadores tivessem uma atuação muito maior do que temos hoje. Eles deveriam ter uma maior representatividade da sua categoria. E não é sempre que encontramos essa postura.
AT Isso significa que os sindicatos deveriam deveriam dar mais atenção à política sindical, em detrimento da política partidária. É isso, doutor?
Marcondes Acho que a sua observação é importante. Seria fundamental que os sindicatos priorizassem a política sindical em benefício da sua categoria do que quererem dar um viés partidário à sua atuação. Você representa os interesses da categoria e não de partidos.
AT Está em curso um processo que pode, a médio e longo prazos, criar uma única categoria de avulsos no Porto a partir da multifuncionalidade, com a possibilidade até de uma eventual unificação de sindicatos. O senhor aprova a multifuncionalidade?
Marcondes Eu não conheço a fundo esse processo. Para mim é uma novidade. Realmente não tenho opinião formada sobre isso, precisaria pensar um pouco mais a respeito.
AT O MPT está satisfeito com o trabalho do Ogmo? O senhor tem acompanhado o trabalho do Ogmo?
Marcondes Temos essa coordenadoria nacional que tem solicitado algumas adaptações tanto do Ogmo e mesmo dos sindicatos. Tenho conhecimento que os avulsos têm um certo descontentamento com a atuação do MPT. Queremos aplicar e defender a legislação dos portos. Sei de algumas dificuldades que os procuradores têm encontrado, mas a visão que nós temos é que essa questão está sendo encaminhada aos poucos, está sendo muito bem conduzida pelos procuradores. O Ogmo ainda vai passar por algumas transformações, da mesma forma que os sindicatos.
Fonte: A Tribuna
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